Quando pensamos na China, dificilmente nos vem à cabeça a calçada portuguesa, os tradicionais azulejos azuis e brancos ou igrejas barrocas. Mas Macau é isso tudo — e muito mais. É um lugar onde o pastel de nata convive com o dim sum, onde o nome das ruas está em português (mesmo que já ninguém o fale), e onde o nosso passado colonial deixou marcas que resistem ao tempo e à modernidade. Estive em Macau este verão, entre semanas pela Ásia, e foi como se tivesse voltado por uns dias a casa, apesar de continuar do outro lado do mundo. Deixo-vos ficar com os pontos imperdíveis – a adicionar a qualquer roteiro – daquele que é o património português em Macau, que ainda se mantém intacto, bem conservado e que torna imperdível esta paragem na Ásia.
1. Ruínas de São Paulo: a fachada que resiste ao tempo
Começamos pelo postal mais famoso de Macau. Impossível ir a Macau e não subir a mais famosa escadaria que nos levam até lá. A fachada da antiga Igreja da Madre de Deus é tudo o que resta de um complexo jesuíta do século XVII, destruído por um incêndio em 1835. Esculpida em pedra, com símbolos cristãos, orientais e até mitológicos, é um verdadeiro livro de pedra.
2. Fortaleza do Monte: a sentinela de Macau
Mesmo ao lado das Ruínas de São Paulo, está a subida para esta fortaleza, construída pelos jesuítas no século XVII para proteger o colégio e a cidade. Hoje em dia é um dos melhores miradouros de Macau – onde se destaca a vista para o famoso Casino Lisboa. Lá dentro, o Museu de Macau conta a história da cidade desde os tempos pré-portugueses até à transição para a China.
3. Largo do Senado: o coração português da cidade
Calçada portuguesa, edifícios coloniais, igrejas barrocas e… multidões. O Largo do Senado é o centro nevrálgico de Macau histórico. Aqui sente-se o pulsar da cidade, entre turistas, locais e lojas de tudo e mais alguma coisa. A Igreja de São Domingos, com o seu amarelo vibrante, é um dos destaques, numa das extremidades da Praça, e o Instituto para os Assuntos Municipais no outro topo merecem uma visita.
4. Teatro D. Pedro V: cultura com sotaque luso
Inaugurado em 1860, este teatro foi um dos primeiros do género na Ásia. Com fachada neoclássica e interior elegante, ainda hoje acolhe espetáculos e eventos culturais. É um símbolo da vida social da comunidade portuguesa em Macau, e um daqueles lugares que nos fazem esquecer que estamos na China. Situa-se num bairro tradicional de arquitetura colonial portuguesa, mas bem mais sossegado apesar de estar a uma curta caminha da Praça do Senado.
5. Fortaleza de Santiago da Barra
A mais antiga fortificação portuguesa em Macau, construída para proteger o Porto Interior. Pequena, mas cheia de charme, com uma capela dedicada a São Tiago e vistas sobre o rio. É um daqueles lugares mais tranquilos, longe da confusão, e já a caminho da ilha de Taipa.
6. Centro histórico da Taipa
A Taipa é uma ilha ligada à península por pontes, e o seu centro histórico é composto por um pequeno emaranhado de casas coloniais restauradas, ruas estreitas, o Museu da Taipa e Coloane, e uma mistura deliciosa de culturas. também aqui, o português e o cantonês convivem lado a lado — nos nomes das ruas, nos pratos típicos e até nas fachadas das casas. Evitem lá ir ao final de semana (se possível) não há capacidade para a quantidade de pessoas que circula por lá.
Um pouco mais longe do centro histórico, mas ainda na Taipa, não deixem de visitar a zona das Casas-Museu da Taipa e a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, com vista para a lagoa e a nova zona de casinos da ilha.
7. Coloane: o lado mais sereno de Macau
Se Taipa é charmosa, Coloane é tranquila. A ilha mais a sul de Macau apresenta um ritmo mais lento, com vilas piscatórias, igrejas simples e destaca-se pela sua natureza, com zona de montanha e trilhos para explorar. É aqui que se encontra a famosa Lord Stow’s Bakery, onde o pastel de nata ganhou fama asiática. Acabei por não provar este, já que encontrei uma Manteigaria mesmo em Macau. Mas foi aqui que fiquei alojada, na Pousada de Coloane, um antigo edifício colonial – que precisava de alguma conservação, é verdade – mas que foi a solução de alojamento ideal para relaxar e viver o espírito português de Macau. Situada numa pequena encosta perto da praia de Cheoc Van, está muito bem ligada por autocarro à cidade e longe de toda a agitação. Recomendo.
(+) Pousada de Coloane | Ilha de Coloane | Macau
Sabores de casa no outro lado do mundo: a gastronomia portuguesa em Macau
Uma das maiores surpresas (e alegrias!) da minha viagem a Macau foi perceber que, mesmo do outro lado do mundo, é possível matar saudades de casa… à mesa. A herança portuguesa não se vê só nas fachadas ou nas igrejas — sente-se no prato, no aroma e até nos nomes dos pratos.
Comecemos pelo minchi, um clássico da cozinha macaense que me conquistou logo à primeira garfada. Carne picada, batata frita aos cubos, ovo estrelado por cima e um toque de molho de soja que lhe dá aquele sabor único, entre o conforto da comida caseira e a fusão com o Oriente. É simples, mas absolutamente delicioso. Uma espécie de carne de porco à alentejana sem vieiras e um toque asiático.
Outro prato que me surpreendeu foi o zhu pa pau — uma espécie de sanduíche de costeleta de porco panada, servida num pão fofo e quente. É o primo exótico da bifana, com um toque asiático que lhe dá personalidade. Infelizmente essa ficou por provar. Estava na lista, mas o tempo (e o apetite) não chegaram para tudo. Fica a desculpa perfeita para voltar.
O mais incrível é que, em Macau, é possível encontrar praticamente todos os clássicos da cozinha portuguesa: caldo verde, ameijoas à Bulhão Pato, bacalhau à Brás, arroz de pato, pastéis de nata, vinho verde, azeitonas… Super Bock. Há mercearias com produtos portugueses, restaurantes com nomes familiares e pratos que nos fazem esquecer que estamos a milhares de quilómetros de casa.
Comer em Macau é, por isso, uma viagem dentro da viagem. Uma travessia entre continentes, feita à mesa, com garfo numa mão e pauzinhos na outra – e ainda mais que os edifícios é a prova viva do património português em Macau.
Património Português pelo Mundo
(+) Galle | Património colonial no Sri Lanka
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